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José de Abreu (viii) : O brasão de armas

Salve!

Eis mais um post sobre o Barão do Serro Largo. Mas agora, nada muito pesado: vamos falar de amenidades. Especificamente, vamos falar sobre o brasão de José de Abreu.

***

Digo amenidades, tendo em mente que este deveria ser um post simples, envolvendo pouca celeuma. Mas quase tudo que se refere ao Marechal Abreu vem imbuído de uma “História da história”, parafraseando o já mencionado múltiplas vezes, general Francisco de Paula Cidade.

Explico: a primeira menção que encontrei sobre este brasão vem do Nobiliário Sul Rio Grandense, de Mário Teixeira de Carvalho, publicado em 1937.[1] Não vem especificada a data da carta de brasão de armas, apenas menciona-se que

“Foram-lhe concedidas as armas dos Abreus: Em campo de vermelho cinco cotos de águia de ouro, postos em aspa. Por diferença, uma brica de ouro com um trifólio de sua cor. Timbre: o coto das armas. Elmo de prata aberto e guarnecido de ouro. Paquife do metal e cores das armas.”

… tudo isso após mencionar o título de barão, recebido em 12 de outubro de 1825. Das fontes apontadas no nobiliário, à página 299, duas poderiam conter a informação original, e são elas:

 

1) O Dicionário Enciclopédico do Rio Grande do Sul – 1º fascículo, Vol. 1, de Aurélio Porto, publicada no ano anterior, em julho de 1936.[2] Esta é uma edição relativamente rara, a qual eu adoraria ter em mãos, contendo páginas dedicadas não só a José de Abreu, mas também ao filho primogênito Cláudio José de Abreu, que é também meu ancestral direto. Por muita sorte, uma página deste volume encontra-se fotografada e legível, publicada por um vendedor que oferece este fascículo em bom estado, embora incompleto. Na página 34, encontra-se estampado o escudo que procuramos.
Êi-lo:

O brasão, ilustrado no volume acima citado. Não foi ainda possível saber se o mesmo volume traz também a descrição do brasão, e se faz menção à carta de brasão de armas. A visibilidade não é das melhores, mas dentro do campo do escudo, vejo apenas os cotos de águia (e talvez, uma brica)

2) Os artigos sobre o Marechal Abreu publicados no Jornal do Comércio, em 1934, escritos por Egon Prates.[3][4] Ali não se encontra menção sobre o brasão. A propósito, Egon Prates – cujo nome por extenso era João Egon d’Abreu Prates da Cunha Pinto – era neto de Cláudio José de Abreu e sua esposa Réa-Silvia Gomes de Abreu, pertencendo ao ramo dos Abreu Prates (assim como uma bisavó desta, que vos escreve). Fez um trabalho minucioso e bem embasado, embora não completamente isento de enganos, sobre o Barão do Serro Largo, que foi seu bisavô. É surpreendente que Egon Prates Pinto não conhecesse o brasão do seu, do nosso avoengo, pois tinha enorme gosto pela heráldica, e até 1936, segundo Francisco de Paula Cidade, era detentor da carta de nobreza do barão,[5] e portanto encarregado da salvaguarda deste documento, que já naquela época fora emitido havia mais de um século. Egon Prates  Pinto era tão conhecedor da heráldica que publicou, em suplementos da antiga Revista da Semana, um conjunto de brasões iluminados (incluindo biografias dos portadores e as datas das cartas de brasão de armas), e o conjunto desta obra chamou-se o Armorial Brasileiro (Brasil Colônia).

 

Voltando ao Nobiliário Sul-Riograndense, este traz a seguinte representação do brasão:

Ilustração do brasão contida no Nobiliário Sul Rio Grandense. O brasão correspondente seria: de vermelho, cinco cotos de águia de ouro postos em aspa. A brica de ouro com trifólio foi omitida, incorrendo em erro na representação.

 

A representação acima não corresponde à descrição do brasão contida no mesmo livro. Walter Spalding, em Os Construtores do Rio Grande do Sul, Vol.II,[6] parece ter sido o primeiro a publicar nota sobre essa incoerência, notando a falta da diferença na representação do brasão.

***

Para os que gostam da coisa toda bem tecnicalizada, como eu…

A brasonaria tem todo um vocabulário próprio, sendo que o brasão propriamente dito é a “fórmula”, a descrição da imagem do escudo, e à sua ilustração heráldica também pode-se chamar iluminura. Assim, a frase “Em campo de vermelho cinco cotos de águia de ouro, postos em aspa. Por diferença, uma brica de ouro com um trifólio de sua cor.” é o brasão, significando:

Em campo de vermelho : sobre um fundo vermelho
cinco cotos de águia : cinco asas de águia
de ouro : de cor dourada
postos em aspas : dispostas formando um X.

 

Até aqui, este é o brasão original do Abreu chefe, a quem ele primeiro foi concedido.

 

O escudo de armas de Abreu (chefe) é muito antigo e encontra-se representado em vários livros. Mas nenhum deles me parece mais lindamente iluminado que o Livro da Perfeiçam das Armas, de Antonio Godinho, cerca de 1530 (vide imagem 34). Este NÃO pertence a José de Abreu. Como já foi explicado em outro post deste mesmo blog – brasões não pertencem a sobrenomes, e sim a linhagens.

 

E a brica com trifólio? A brica é justamente a diferença do brasão de José de Abreu, que o torna unicamente seu, é um elemento heráldico que pode ser descrito como um quarto do cantão chefe direito, localizado no canto superior esquerdo do escudo. O cantão tem um nono da área do escudo, medindo um terço da largura e da altura. Trocando em miúdos, a brica é um retângulo medindo cerca de um sexto da largura e altura totais do escudo, localizada no canto superior esquerdo do campo do brasão (desconsiderando aqui a lateralidade invertida da heráldica, a fim de descomplicar este post). No próprio Armorial Brasileiro, já referido, encontram-se exemplos deste elemento:

 

O brasão de Félix Pereira da Piedade em O Armorial Brasileiro, de Egon Prates Pinto. Iluminura de Luiz Gomes Loureiro. Da extinta Revista da Semana, Hemeroteca Digital Brasileira. A brica com o trifólio foram destacados por esta, que vos escreve.

 

Já o trifólio é uma carga heráldica (uma figura) abstrata, são três folhas unidas ao centro, em geral apontando para cima, e o termo “de sua cor” quer dizer da cor que seria encontrada ao natural, ou seja, verde.

 

O trifólio ilustrado em Dibujo Heraldico, um blog ultra informativo e didático – autoria e desenho do heraldista Xavier Garcia.

 

Os elementos descritos a partir do timbre, incluindo elmo e paquife, são ornamentos heráldicos, e sua representação não é obrigatória. Indispensáveis para a representação correta do brasão são apenas os elementos que estão dentro do campo, onde sempre estão as chamadas “diferenças” ou brisuras, que são uma tentativa de individualização do brasão, especialmente entre portadores de brasões que pertencem a um mesmo ramo familiar.

***

Sobre a prática de incluir a brica em brasões concendidos no Brasil, recomendo a leitura deste post, no blog Arte Heráldica, de Eduardo Henriques d’Castro:

 

“A casa deste “desrespeito”, pelo menos no Brasil, nos é elucidada pelo Professor Baroni Santos (6), alegando que  era costume dos reis de armas do Cartório de Nobreza e Fidalguia fazer a elaboração de brasões conforme a homonímia sem verificar se a pessoa que receberia as armas em questão era ou não pertencendo à família armigerada, sendo tomado o cuidado de acrescentar-se uma diferença para não incorrer na usurpação.”

 

LEITURA RECOMENDADA : BRICAS E DIFERENÇAS

Este parecer faz o mais perfeito sentido, considerando-se que Abreu era o único sobrenome usado pelo marechal, e que a comprovação de ter direito ao uso do brasão dos Abreu por descendência seria muito improvável – vide este post.

Ainda em Arte Heráldica, outro post esclarece sobre as condições de hereditariedade de um brasão:

“Os títulos e brasões ad personam são aqueles que pertenciam à cargos administrativos do império e seus títulos de nobreza que não eram “de jure e  herdade”, por exemplo, os títulos comprados da nobreza togada do Brasil ou a nobreza adquirida através de postos de milícia portugueses e brasileiros, estes não podiam ser passados aos descendentes. Assim, só eram possuidores de brasões e títulos hereditários as famílias nobres do que hoje se considera como nobreza histórica ou constituíram regime de morgado.”

 

***

Restam, assim, duas questões:

1) Onde está a carta de brasão de armas de José de Abreu? Se algum leitor hipotético tem acesso ao Dicionário Enciclopédico do Rio Grande do Sul, ou fonte ainda melhor, por favor e obrigada, mande notícia. Seria de se esperar que alguma fonte secundária pudesse apontar a fonte original do brasão. A busca por esta informação é particularmente intrigante, dada a triste história de Possidônio Carneiro da Fonseca Costa, o primeiro Rei de Armas do Brasil.

 

2) Como seria a iluminura correta do brasão do Marechal José de Abreu, incluindo a diferença da brica com trifólio? Eis aqui mais um, ou mais três oferecimentos desta, que vos escreve:

 

Brasão de José de Abreu: escudo raso. (De vermelho, cinco cotos de águia de ouro postos em aspa. Por diferença, uma brica ouro com um trifólio de sua cor). A brica com trifólio está no canto superior esquerdo (em heráldica, dito cantão chefe direito). Uma ilustração desta, que vos escreve, com inkscape.

 

Brasão de José de Abreu: Realização heráldica completa, com ornamentos: elmo, paquife e timbre. Mais uma ilustração desta, que vos escreve, com inkscape.

 

O brasão de José de Abreu : realização heráldica mais-que-completa, incorporada a coroa de barão e as insígnias de Comendador da Ordem de Avis e Cavaleiro da Ordem do Cruzeiro. Ainda mais uma ilustração desta, que vos escreve, com inkscape.

A confecção destas “iluminuras” não seria possível, se não pelo trabalho dos heraldistas que listo a seguir, cujos trabalhos encontram-se na Wikimedia Commons, podendo incluir elementos que foram usados ou adaptados de:

 

***

Feita mais esta retificação sobre o Barão do Serro Largo, aqui despede-se por ora esta, que vos escreve

helga

~Helga.

 



Fontes
[1] CARVALHO, Mário Teixeira de. Nobiliário Sul Riograndense (1937), 2ª ed. Porto Alegre: Renascença : Edigal, 2011.
[2] PORTO, Aurélio.Dicionário Enciclopédico do Rio Grande do Sul – 1º fascículo, Vol. 1. Porto Alegre: Minuano, 1936.
[3] PINTO, João Egon de Abreu Prates da Cunha. O Marechal de Campo José de Abreu : Barão de Serro Largo : Notas extraídas do trabalho em preparo “Os Esquecidos da História”, I. Rio de Janeiro: Jornal do Comércio. 27 de maio de 1934, p. 6.
[4] PINTO, João Egon de Abreu Prates da Cunha. O Marechal de Campo José de Abreu : Barão de Serro Largo : Notas extraídas do trabalho em preparo “Os Esquecidos da História”, II. Rio de Janeiro: Jornal do Comércio. 10 de junho de 1934, p. 8.
[5] CIDADE, Francisco de Paula. Dois Ensaios de História. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1966.
[6] SPALDING, Walter. Construtores do Rio Grande, II Volume. Porto Alegre: Livraria Sulina Editora, 1969.

José de Abreu (vii) : A linhagem materna

Salve!

 

À diferença do post anterior, esta entrada vai mais suave. Exceto que há, entre vários autores, uma discussão histórica sobre a mãe do Barão do Serro Largo. A pesquisa da linhagem materna do general flui sem grandes reviravoltas e revelações, mas, todavia, entretanto, porém – o que encontramos no papel – e o papel aceita tudo – vai de encontro à uma certa uniformidade na descrição do aspecto físico de José de Abreu.

Na verdade, a confusão começa com algumas declarações contraditórias do próprio marechal. Dizia-se filho legítimo de João de Abreu com Ana Maria de Jesus, natural de Rio Grande – declarações dele mesmo. Mas, como já explicado antes aqui, sendo filho legítimo de João de Abreu, só poderia ter como mãe Ana Bernarda de Jesus ou de Souza. A confusão de nomes, ou na verdade, o que eu chamaria de uma certa flexibilidade onomástica, era muito comum nos registros anteriores ao século XX. Até aí, nada de estranho.

 

Leitura recomendada:
Sobre a onomástica no período Colonial (Martha Hameister)

O erro da naturalidade desta mãe – dita rio-grandina ao invés de terceirense – é também perdoável: o Barão considerava a si próprio rio-grandino, muito embora soubesse perfeitamente que era carolino, ou seja, natural de São Carlos de Maldonado. O que realmente coloca uma pulga atrás da orelha é como o seus contemporâneos lhe descrevem, ao mencionar por vezes algum atributo físico considerado indígena, por vezes o domínio fluente que ele tinha da língua Guarani.

Há, porém, uma construção histórica do personagem do marechal: à medida em que vários autores acrescentam sobre as obras uns dos outros, podem inadvertidamente exagerar características, que foram atribuídas sob a ótica das percepções pessoais, e que pertencem, por sua vez, à mentalidade e as concepções de um determinado lugar e tempo; e assim, podem ser mais ou menos verdadeiras. Nessas perguntas, ainda gostaria de ir mais a fundo em outra oportunidade.

Feitas essas ressalvas, começo pelo casamento de Ana Bernarda de Jesus com João de Abreu, pais do Marechal José de Abreu:

Lê-se: “Aos vinte e hum dias do mes de Outubro do anno de mil setecentos e cincoenta e sete, nesta Matriz de São Pedro do Rio Grande de São Pedro feitas as tres canonicas denunciaçoens na forma do Sagrado Concilio Tridentino e em presença de mim, Vigário da Igreja e da Manuel Francisco da Sylva e das testemunhs abaixo asinadas o Coronel de Dragoens Thomás Luiz Ozorio, e o Capitão mor Francisco Coelho Ozorio se cazarão em face da Igreja solenemente João de Abreu, filho legítimo de Lionel de Abreu e de sua mulher Maria Soares, já defunta, natural da freguesia de Santa Maria do Pinheiro concelho de Vieyra, Arcebispado de Braga, com Anna Bernarda de Jesus, filha legítima de Antonio de Souza, já defunto, e de Antonia Clara da Conceição, baptizada na Vila da Praia da Ilha Terceira, e lhes dei as bençoens. Por verdade fiz este assento. O vigário.” Via familysearch.

 

Passeando pelos registros de casamentos em Santa Cruz, ilha Terceira, e demais freguesias da mesma ilha – eis o que nos dizem os papéis:

 

António de Sousa e Antónia Clara da Conceição casaram-se aos cinco de agosto de 1737, em Santa Cruz, Ilha Terceira.[1] Este foi o terceiro casamento de Antonio de Souza, viuvo de Maria da Vitória[2] e de Apolónia de Guadalupe;[3] e o segundo casamento para Antónia Clara da Conceição, viúva de Manuel de Aguiar, com que se casara em 1731.[4] António de Sousa era filho de Cosme de Sousa e de Catarina Gomes, todos do Pico. Antónia Clara era filha de Manuel Ferreira (de Aguiar) e de Lourença Maria da Conceição, fregueses de Nossa Senhora da Pena, Fontinhas.

Manuel Ferreira de Aguiar casou três vezes, sendo a primeira esposa Bárbara Dias, em 1676,[5] e a segunda Inês Vieira, em 1677.[6] Casou em terceiras núpcias com Lourença Maria da Conceição, filha de António Teixeira e Bárbara Cardoso, paroquianos de Santa Bárbara, Fonte do Bastardo, aos 4 de abril de 1707, em Santa Cruz.[7] Manuel Ferreira de Aguiar era filho de Simão de Aguiar e Beatriz Alves e faleceu antes de 18 de outubro de 1721, data em que Lourença Maria casa-se pela segunda vez, com Domingos Martins, em Santa Cruz.[8]

Simão de Aguiar e Beatriz Alves casaram-se em 18 de janeiro de 1644, em Lajes, na Terceira.[9] Ele era filho de António Ferreira e Beatriz Alves ou Álvares, fregueses de Agualva, e ela era filha de Francisco Simão e Bárbara Lucas, fregueses de Lajes.

António Ferreira e Beatriz Álvares casaram-se aos 3 de fevereiro de 1613, como a maioria dos casais já citados, também em Santa Cruz:[10] ele, filho de Antão Ferreira e Beatriz Gonçalves, e ela, filha de André Álvares e Maria Pestana.

Em resumo, foi possível alcançar até sete gerações a partir de José de Abreu, como na seguinte tabela, mostrando as gerações mais remotas no topo, até a mais recente, na base:

 

por descobrir
Antão
Ferreira

& Beatriz
Gonçalves
N.±1565
André
Álvares

& Maria
Pestana
N.±1565
por descobrir
António Ferreira
& Beatriz Álvares
N. ±1590
C. 03.02.1613,
S.ta Cruz, Terceira
Francisco Simão
& Bárbara Lucas
N. ±1605

por descobrir  
Simão de Aguiar

N. ±1625

C. 18.01.1644, Lajes, Terceira

Beatriz Alves

N. ±1630

C. 18.01.1644, Lajes, Terceira

António Teixeira

N. ±1665

Bárbara Cardoso

N. ±1670

Manuel Ferreira de Aguiar

N. ±1655, Terceira, Açores

C.c Bárbara Dias 27.01.1676, Santa Cruz, Terceira

C.c Inês Vieira em 19.09.1677, Santa Cruz, Terceira

C. c L.ça M.a da C.çãoem 04.10.1707, S.ta Cruz, Terceira

F. antes de 18.08.1721

Lourença Maria da Conceição

N. ±1690, Terceira, Açores

C.c M.el F.ra de Aguiar em 04.10.1707, S.ta Cruz, Terceira

C. c Domingos Martins em 18.08.1721, Santa Cruz, Terceira

Antónia Clara da Conceição

N.±1715

C.c Manuel de Aguiar em 29.11.1731, Fontinhas, Terceira

C.c António de Sousa em 05.08.1737, Santa Cruz, Terceira

( António de Sousa, filho de Cosme de Sousa e Catarina Gomes,

N. ±1680, Pico, Açores

C.c Maria da Vitória em 12.12.1700, Santa Cruz, Terceira

C.c Apolónia de Guadalupe em 12.01.1722, Agualva, Terceira

C.c Antónia Clara da Conceição em 05.08.1737, Santa Cruz, Terceira

F. antes de 21.10.1757 )

Antónia Clara e António de Sousa foram pais de

Ana Bernarda de Sousa

B. ±1740, Santa Cruz, Terceira, Açores

C. c João de Abreu em 21.10.1757, Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil

F. 28.11.1788 Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil

Ana Bernarda e João de Abreu foram pais de

Vicente, Cláudia Petrona, José de Abreu, Joaquim, Francisco, Romão e Manuel

 

É por hoje, é só…!

 

Desta que vos escreve, a

helga

~Helga.

 

 

Em destaque: Vila Nova, Terceira, Açores. Foto de Luís Godinho / Flickr



Fontes
[1] Casamento de António de Sousa com Antónia Clara da Conceição. Cultura Açores : Fundos Paroquiais dos Açores: Terceira, Praia da Vitória, Santa Cruz: 1737, L.C. 6, fl.1v.
[2] Casamento de António de Sousa com Maria da Vitória. Cultura Açores : Fundos Paroquiais dos Açores: Terceira, Praia da Vitória, Santa Cruz: 1700, L.C. 4, fl.67.
[3] Casamento de António de Sousa com Apolónia de Guadalupe. Cultura Açores : Fundos Paroquiais dos Açores: Terceira, Praia da Vitória, Agualva: 1722, L.C. 1, fl.31v.
[4] Casamento de Manuel de Aguiar com Antónia Clara da Conceição. Cultura Açores : Fundos Paroquiais dos Açores: Terceira, Praia da Vitória, Fontinhas: 1731, L.C. 1, fl.35.
[5] Casamento de Manuel Ferreira de Aguiar com Bárbara Dias. Cultura Açores : Fundos Paroquiais dos Açores: Terceira, Praia da Vitória, Santa Cruz: 1676, L.C. 3, fl.172.
[6] Casamento de Manuel Ferreira de Aguiar com Inês Vieira. Cultura Açores : Fundos Paroquiais dos Açores: Terceira, Praia da Vitória, Santa Cruz: 1677, L.C. 3, fl.178.
[7] Casamento de Manuel Ferreira de Aguiar com Lourença Maria da Conceição. Cultura Açores : Fundos Paroquiais dos Açores: Terceira, Praia da Vitória, Santa Cruz: 1707, L.C. 4, fl.127v.
[8] Casamento de Domingos Martins com Lourença Maria da Conceição. Cultura Açores : Fundos Paroquiais dos Açores: Terceira, Praia da Vitória, Santa Cruz: 1721, L.C. 5, fl.15.
[9] Casamento de Simão de Aguiar com Beatriz Alves. Cultura Açores : Fundos Paroquiais dos Açores: Terceira, Praia da Vitória, Lajes: 1644, L.C. 2, fl.13v.
[10] Casamento de António Ferreira com Beatriz Álvares. Cultura Açores : Fundos Paroquiais dos Açores: Terceira, Praia da Vitória, Santa Cruz: 1613, L.C. 2, fl.116v.

José de Abreu (vi) : A linhagem paterna

Salve!

Este post é dedicado, em continuação a esta entrada, a explorar as origens do general José de Abreu através das fontes documentais de que dispomos.

Primeiro – para tirar esta distração do caminho – vamos examinar este pequeno trecho do Nobiliário Sul Riograndense:[1].

“Entre os componentes da luzida comissão trazida por Gomes Freire de Andrade, achava-se João de Abreu. Fidalgo português, filho segundo de uma das mais nobres, ilustres e antigas famílias do Reino, direto descendente dos Abreus de Entre Douro e Minho, Senhores da Honra e Torre de Abreu e do Pico de Regalados.”

A segunda frase captura o interesse, mas acredito que refira-se a João Gomes de Abreu, filho de Leonel de Abreu e Lima – estes são (mais ou menos) homônimos mas não são exatamente os Abreus que procuramos. Não que não possam estar relacionados; apenas que vamos nos ater aqui, assim como no post anterior, à busca e análise de documentos encontrados nos últimos dias. Quanto à comissão de Gomes Freire de Andrade, toda a descoberta está ainda por fazer.

* * *

Fora isso, como já deve estar muito claro – como já demonstrado aqui e aqui – o marechal era filho de João de Abreu, da freguesia de Santa Maria do Pinheiro, Guimarães, e neto de Leonel de Abreu e Maria Soares.

A melhor fonte primária de que dispomos no Brasil é o registro do casamento dos pais de José de Abreu, como já vimos antes – mas êi-lo aqui mais uma vez:

 

Lê-se: “Aos vinte e hum dias do mes de Outubro do anno de mil setecentos e cincoenta e sete, nesta Matriz de São Pedro do Rio Grande de São Pedro feitas as tres canonicas denunciaçoens na forma do Sagrado Concilio Tridentino e em presença de mim, Vigário da Igreja e da Manuel Francisco da Sylva e das testemunhs abaixo asinadas o Coronel de Dragoens Thomás Luiz Ozorio, e o Capitão mor Francisco Coelho Ozorio se cazarão em face da Igreja solenemente João de Abreu, filho legítimo de Lionel de Abreu e de sua mulher Maria Soares, já defunta, natural da freguesia de Santa Maria do Pinheiro concelho de Vieyra, Arcebispado de Braga, com Anna Bernarda de Jesus, filha legítima de Antonio de Souza, já defunto, e de Antonia Clara da Conceição, baptizada na Vila da Praia da Ilha Terceira, e lhes dei as bençoens. Por verdade fiz este assento. O vigário.”

 

Ali constam as informações como ditas acima. Não há, na Cúria Metropolitana de Porto Alegre, processo de habilitação desse casamento; mesmo assim poderíamos, em regra, admitir que encontraria-se um registro de batismo dele ou ao menos de casamento dos pais na mesma freguesia. Entretanto, como o que se encontra em Pinheiro difere do que diz esse registro, acredito que isso possa ser devido à política dos casais que vigorou na época. Nunca antes a corte de Portugal incentivara tanto o casamento no Rio Grande do Sul.[2]

Sobre o lugar,

 ∼  Santa Maria do Pinheiro ∼

 

A chegada na igreja matriz – Pinheiro, Vieira do Minho. Google Streetview.

É atualmente uma freguesia do município de Vieira do Minho, chamada simplesmente Pinheiro. Buscando nos registros da igreja, a situação assim se desvela:

 

Havia na época realmente um, e apenas um Leonel de Abreu em Santa Maria do Pinheiro. Este homem casou-se em 1702 com Domingas Francisca:

 

Registro de casamento de Leonel de Abreu com Domingas Francisca, 1702. Lê-se: Aos vinte e tres do mes de Abril assisti ao matrimonio que entre si celebraram Leonel de Abreu e sua mulher Domingas Francisca do lugar de Villela foram testemunhas Manoel Soares, Torcato Francisco, Antonio Francisco  e por verdade fiz este assento que assinei de abril 23 de 1702. O P.e Pdero Vieira.” Via familysearch.

 

Uma vez viúvo, Leonel de Abreu casou-se com Úrsula Francisca, em 1707:

Registro de casamento de Leonel de Abreu com Ursula Francisca, 1707. Lê-se: ” Aos dois dias do mes de outubro de sete centos e sete nesta Igreja de Santa Maria do Pinheiro se receberam em presença de mim o PAdre João Francisco Cura da dita Igreja do Pinheiro Leonel de Abreu moradro de Villela desta freguesia com Ursula Francisca filha de Francisco Jorge de Figueiredo morador que é no lugar de cima da vila (… continua).” Via familysearch.

 

Com a primeira esposa, teve dois filhos, chamados Manoel e Maria; com a segunda, mais três filhas pelo menos, a saber: Thereza e Ana;

(para os dados vitais destes filhos – encontram-se transcritos no link abaixo:)

VIDE: Heróis do Homem e Cávado – Pinheiro

E mais uma pelo menos, chamada Rosa e batizada em 20 de maio de 1714, e nascida no dia 13 do mesmo mes e ano. (vide familysearch).

Se João de Abreu era filho legítimo de Leonel de Abreu e Maria Soares de Santa Maria do Pinheiro, Vieira, Braga, só poderíamos imaginar que Leonel de Abreu tivesse casado pela terceira vez. Mas na verdade Leonel de Abreu faleceu viúvo de Ursula Francisca, que falecera poucos meses antes dele, excluindo, salvo talvez perfilhações, toda a possibilidade de filhos legítimos dele com Maria Soares:

Óbito de Leonel de Abreu, 1756. Lê-se: “Aos vinte e nove dias do mes de Dezembro de mil sete centos e cincoenta e seis anos faleceu Leonel de Abreu, viúvo do lugar de Vilela desta freguesia de Santa Maria do Pinheiro só com o sacramento da Penitencia de uma colica e lhe não dar lugar a receber os mais sacramentos e se sepultou nesta igreja em os trinta dias do dito mes e ano não fez testamento e não tinha de que e para constar fiz este termo era ut supra.” Via familysearch. A esposa, Ursula Francisca, falecera em 29 de julho do mesmo ano – os assentos acham-se quase juntos, na mesma página deste livro paroquial.

 

Enfim, conclui-se que não apenas os filhos de Leonel de Abreu com Maria Soares foram naturais, ou seja, fora de um casamento formalizado, mas também extraconjugais. Seria de se esperar que fosse praticamente impossível constatar que realmente existiram tais filhos. Considerando a situação, é de uma sorte extraordinária que realmente pode-se encontrar evidências documentais de que existiu, sim, geração deste casal nada formal. A primeira pista é o casamento de um desses filhos, dito explicitamente filho natural de Leonel de Abreu e Maria Soares, em 1751. Este filho chamava-se Custódio de Abreu Soares, e havia sido batizado em 1722, como se vê no texto atípico do assento de batismo:

 

Registro de batismo de Custódio Soares (parte 1)

Registro de batismo de Custódio Soares (parte 2). Lê-se: “Custódio, filho de Maria Soares mulher de Francisco Pereira ausente do lugar de Vilella desta freguesia de Santa Maria do Pinnheiro nasceu aos treze dias do mês de Janeiro do ano de mil sete centos e vinte e dois por nascer com perigo de morte foi baptizado por Benta Affonso mulher de Bartholomeu Vieira do mesmo lugar de Vilella em casa não obstante por algumas razões que me pareceu o dito baptismo dúbio e assim foi baptizado debaixo de condição nesta Igreja por mim Julião de Araujo Abade dela aos quinze dias do mesmo mes e ano foram padrinhos debaixo de condição Mattheus Affonso e a dita Benta Affonso atras nomeada ambos desta freguesia de Santa Maria do Pinheiro e por verdade fiz este termo que assino com o padrinho era ut supra. O Abb.e Juliam de Araujo”. Via familysearch.

 

E eis o casamento deste mesmo filho, como acima citado:

 

Casamento de Custodio de Abreu Soares, 1751. Lê-se: “Aos dois dias do mes de maio de mil sete centos e cinquenta e um feitas primeiro as denunciações na forma costumada e apresentada licença do Reverendo Doutor Juiz dos casamentos da cidade de Braga em face eclesia se receberam Custódio de Abreu Soares filho natural de Leonel de Abreu e de Maria Soares da freguesia de Santa Maria do Pinheiro com Thereza da Cruz, filha legítima de Francisco da Cruz e de Senhorinha Gonçalves… (continua)”. Via familysearch.

Ainda em Pinheiro, mais uma filha de Maria Soares é mais tarde dada como filha natural de Leonel de Abreu.

Esta era Clara, nascida em 1727 e mãe em 1748:

 

Batismo de Clara, filha de Maria Soares, 1727. Lê-se: “Clara, filha de Maria Soares, esta mulher de Francisco Pereira do lugar de Vilela (…). Via familysearch.  Para os habituados com os registros paroquiais, a formulação da primeira linha chama atenção, como se a filha fosse de Maria Soares apenas, que é esposa de Francisco Pereira. Realmente no batismo de Custódio em 1722 (acima), este Francisco Pereira está descrito explicitamente como ausente.

 

Batismo de João Batista, filho de Clara e neto de Leonel de Abreu, 1748. Lê-se: “(…) Clara, solteira, esta filha natural de Leonel de Abreu do lugar de Vilela (…)”. Via familysearch.

 

Sobre o marido ausente de Maria Soares, nos óbitos de Pinheiro está o falecimento, por notícia de Francisco Pereira, em 1732, deste homem que, conforme o assento, partira havia anos para o Alentejo:

Falecimento de Francisco Pereira, 1732. Lê-se: “Desta freguesia de Santa Maria do Pinheiro (…) já há anos para as partes do Alentejo um Francisco Pereira marido de Maria Soares de baixo do lugar de Vilela desta freguesia e veio a notícia e certidão em como  era felecido (…) hoje, de Abril vinte e cinco e mil sete centos e trinta e dois”.

Quanto a filhos deste homem com Maria Soares, não encontrei nenhum batizado em Pinheiro; e aos 3 de maio de 1738 já se encontra o assento de óbito da própria Maria Soares (vide: familysearch.) O assento cita um filho chamado João Soares, casado com Rosa Maria alguns meses antes, em 25 de novembro de 1737 (vide: familysearch.) Este João Soares já era testemunha do casamento de Manoel Pereira em 27 de julho de 1733, junto com Leonel de Abreu (vide: familysearch), e também testemunha de batismo de uma filha de Clara, a filha natural de Leonel de Abreu, em 1759. No momento, suponho que este João Soares, que assinava sempre João Francisco Soares, seja filho de Maria Soares com Francisco Pereira, e que o batismo se encontre em outro local, que não Pinheiro nem Canteleães, como vamos ver.

 

Então, expostas as circunstâncias, conclui-se que realmente houve filhos de Leonel de Abreu com Maria Soares, que encontrava-se sozinha e que veio a falecer deixando, pelo menos, um filho de 16 e uma filha de 11 anos. Esses filhos são mais tarde descritos como filhos naturais de Leonel de Abreu, enquanto casado com Ursula Francisca, e considerando o contexto da época, suponho que, na falta da mãe, Leonel não teve alternativa a não ser acolher esses filhos, que eram menores. Em Pinheiro, Custódio e Clara são os dois únicos de que se tem notícia; e assim, resta a pergunta:

E João de Abreu?

Passei a procurar nas freguesias vizinhas. Assim, de João, filho de Maria Soares, encontrei por fim o seguinte registro, em uma freguesia próxima, chamada Canteleães:

 

Registro de batismo de João, filho de Maria Soares, 1722. Lê-se: “João. Aos dezoito dias do mês de Julho de mil sete centos e dous [sic – nota – o registro está em 1722, o ano por extenso foi anotado incompleto] annos pus o P.e Antonio Vieira Machado os santos oleos a João engeitado em casa de Domingas de Abreu de taboadello frg.a de Pinheiro a coal disse ser filho de Maria Soares de Villella e disse que lhe botava agua somente o P.e Bernardo de Souza de Cabeceiros Douro, era ut supra – eu o Abb.e Agostinho de Araujo”. Via familysearch.

Apesar do conflito das datas dos batismos de Custódio e João, que ocorrem no mesmo ano de 1722, separadas por seis meses de intervalo, a situação era tal que Maria Soares provavelmente buscava ocultá-la, até não mais poder; e neste ponto, deve ter batizado um ou ambos desses filhos com algum atraso. A João não é dada uma data exata de nascimento, sendo oficialmente exposto em casa de Domingas de Abreu, cujo parentesco com o bebê ainda não pude determinar, mas que, decerto, existe.

* * * Entre parêntesis,

O estudo desta linhagem toca em temas imortais de comportamento, que em muito me interessam e dos quais pouco se fala em genealogia: são eles o do abandono familiar, o dos romances ilícitos, e o dos filhos naturais. Longe de emitir julgamento, deixo neste post os fatos como os encontrei apenas, e espero, num futuro próximo, explorar mais os aspectos subjetivos destes temas universais.

* * *

Continuando, considerando que os documentos encontrados já me permitem confirmar a filiação de João de Abreu, resta expandir o estudo para as gerações anteriores.

Quanto a Maria Soares, o registro do casamento dela com Francisco Pereira não aponta de quem ela é filha; e, sendo o seu nome relativamente comum, e conhecendo-se a imprevisibilidade da atribuição de sobrenomes no mundo lusófono de antanho, até o momento não posso presumir as suas origens. Este registro encontra-se, por ironia, logo acima do assento do primeiro casamento de Leonel de Abreu, já mostrado acima. Êi-lo:

 

Casamento de Francisco Pereira com Maria Soares, 1700. Lê-se: “Aos sete dias do mes de outubro do anno de mil sete centos assisti ao matrimonio que entre si celebraram Francisco Pereira e sua mulher Maria Soares do lugar de Villela. Foram testemunhas Manoel Soares e Domingos Francisco da eira e Domingos Marques todos do mesmo lugar e por ser verdade fiz este assento e assinei era ut supra – o P.e Pedro Vieira.” Via familysearch.

Já sobre a filiação de Leonel, já estava descrita em Heróis do Homem e Cávado – faço aqui apenas o trabalho de mostrar:

 

Batismo de Leonel de Abreu, 1681. Lê-se: “Aos nove de Agosto de mil seiscentos e oitenta e um  anos batizei a Lionel filho de Silvestre Francisco e de sua mulher Madalena de Abreu do lugar de Taboadelo foram padrinhos Lionel solteiro e Maria filha de Madalena Soares de Barredo freguesia de Cantelães e por ser verdade assinei. Gonçalo Ribeiro” Via familysearch.

 

Os pais de Leonel, Silvestre Francisco e Madalena de Abreu, faleceram em 26 de dezembro de 1714 (vide familysearch) e 10 de maio de 1712, (vide familysearch) respectivamente. Até o momento, não sei onde e quando se casaram, se casaram-se, e nem de quem foram filhos. Sobre Leonel de Abreu, era ferreiro, e foi testemunha de vários batismos e casamentos, e assim assinava o próprio nome:

 

 

Assinatura de Leonel de Abreu, 1718, testemunha de casamento de Manoel Francisco e Isabel Soares. Por acaso ou não, a mãe da noiva, já defunta, chamava-se também Maria Soares.

 

Como parecem, até agora, estar esgotadas as informações que se podem extrair dos registros de batismos, casamentos e óbitos, resta garimpar, em algum futuro próximo (tomara) em algum arquivo de Braga, em busca de róis de confessados, habilitações de casamento, possíveis perfilhações, etc.

 

∼ Recapitulando ∼

 

por descobrir  por descobrir  filiação por descobrir 
Francisco Silvestre

F. 26.12.1714

Pinheiro, Vieira do Minho, Portugal

Madalena de Abreu

F. 10.05.1712

Pinheiro, Vieira do Minho, Portugal

Leonel de Abreu

B. 09.08.1681, Pinheiro, Vieira do Minho, Portugal

F. 29.12.1756, Pinheiro, Vieira do Minho, Portugal

Maria Soares

F. 03.05.1738, Pinheiro, Vieira do Minho, Portugal

João de Abreu

B. 18.07.1722, Canteleães, Vieira do Minho, Portugal

C. 21.10. 1757 c Ana Bernarda de Souza, Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil

F. 23.05.1790 Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil

Vicente Cláudia José Maria Joaquim Francisco Romão Manoel

 

* * *

Por fim, vai um humilde agradecimento ao já citado Heróis do Homem e Cávado, blog do gentilíssimo senhor António Gonçalves, no qual algumas destas informações (especialmente pré-1720) já estavam transcritas e o qual em muito auxiliou a interpretar os documentos que encontrei, e que felizmente também já os incorporou parcialmente no seu blog – que é, aliás, uma excelente fonte de informações.

E, até o momento, nada mais sei.

Desta que vos escreve, a

helga

~Helga.

 

Em destaque: Quinta do Emigrante, Pinheiro (Maria Carvalho) – powered by Google



Fontes
[1] CARVALHO, Mario Teixeira de. Nobiliário Sul-Riograndense. porto Alegre, 1937.
[2] QUEIROZ, Maria Luiza Bertolini. [PDF] A Vila do Rio Grande de São Pedro : 1737-1822.  Florianópolis : UFSC : dissertação de pós-graduação em História, 1985.

(Nota: esta tese foi publicada como livro, com prefácio de João José Planella, em Rio Grande pela editora da Fundação Universidade de Rio Grande, em 1987).

José de Abreu (v) : Quando e onde nasceu?

Saiba: todo mundo foi neném

Einstein, Freud e Platão também

∼ Arnaldo Antunes, “Saiba”

Salve!

Perdi a conta de quantas vezes encontrei datas e locais diferentes apontados como os do nascimento de José de Abreu, Barão do Serro Largo – sem nunca, entretanto, apontarem as evidências das quais teriam sido extraídas as informações. Este post é, portanto, um convite a passear pelas fontes documentais que nos permitem constatar que, no padrão atual

∼ São Carlos (Maldonado, Uruguai),
1770 ∼

são a data e local de nascimento mais corretos do Barão do Serro Largo.

“Segundo quem?”

– Segundo ele mesmo.

Vamos também compreender melhor a fonte de alguns erros que se repetem e se difundem sem cuidados, de reprodução em reprodução. Aviso já que

∼  A grande dificuldade 

em determinar precisamente a data e local de nascimento do Barão é a falta dos registros de batismo em ambos os possíveis locais de nascimento no período em que ele nasceu: Rio Grande, em que faltam os livros no período da ocupação espanhola, entre 1763 e 1776; e São Carlos, em que faltam os registros dos primeiros anos de fundação, entre 1763 e 1770.

No entanto, apesar de muitas obras publicadas com erros, crédito deve ser dado, em particular a duas obras que chegam o mais próximo possível de encerrar a questão ao redor da qual gira este texto. São elas o esboço biográfico do Barão do Rio Branco,[1] por apontar uma fonte essencial de informação; e, não menos importante, pela diligência na crítica e obtenção de informações valiosas, o ensaio histórico do general Francisco de Paula Cidade.[2] Outras fontes que incluirei aqui confirmam o que se sabe a partir das informações contidas nestes dois volumes.

∼  Vamos aos fatos…

A primeira evidência, a que nos permite fixar 1770 como data autodeclarada de nascimento do Marechal José de Abreu, com muita clareza, é a matrícula no Regimento de Infantaria e Artilharia de Rio Grande, em 28 de dezembro 1784:

Nota que recebi: José de Abreu, filho de João de Abreu, de idade 14 anos. Recebeu 5$300, como o de f. 76, em 28 de dezembro de 1784. Vence de 28 de dezembro de 1784 que se ofereceu voluntariamente para o Real Serviço.[3]

Sobre a naturalidade de Abreu, Francisco de Paula Cidade aponta o registro de batismo de José Inácio  da Silva Abreu, filho do Marechal, como a evidência que encerra a questão sobre o local de nascimento (Maldonado).[2] Anterior a esse registro, há o casamento do então soldado José de Abreu, em 1794.[4] Das informações contidas neste registro derivam, evidentemente, os dados copiados nos batismos dos filhos do casal. Eis o documento, encontrado há alguns anos por esta, que vos escreve:

Lê-se: “Joseph de Abreu com Mª Feliciana. Passei certidão [sic] no 1º de Dezembro de 1827. – Aos vinte dias do mez de Mayo de mil settecentos e noventa e quatro annos nesta Matriz de Porto Alegre as sette horas da noite, depois de feitas as diligências do Estilo, e não havendo impedimento algum conforme o Sagrado Concilio e Constituição; [sic] e por provisão do Reverendo Vigário da Vara Jozeph Ignacio dos Sanctos Pereyra, se receberão em matrimonio com palavras de prezente em que expressarão seu mútuo consentimento Joze de Abreu filho legítimo de João de Abreu e de Anna Maria, natural e baptizado na Matriz de Maldonado, Bispado de Buenos Ayres, com Maria Feliciana, filha legítima de Antonio Sylveira Nunese de Maria da Conceyção, natural e baptizada na Matriz desta Villa. Receberão as Bênçãos, sendo testemunhas os que vão abaixo assignados. E para constar fiz este assento. Assinam: Vigário José Inácio dos Santos Pereira; Januário  e Francisco Fagundes; Antonio Manoel de Sampaio”. Via familysearch.org.

Quase 32 anos depois, já Marechal de Campo e Barão do Serro Largo, José de Abreu reafirma ter chegado aos domínios portugueses na adolescência:[5]

“Desde a idade de 13 annos neste Paiz.” Assina o Barão do Serro Largo, “Quartel General em a Capella de S. Gabriel, 22 de janeiro de 1826”. Hemeroteca Digital Brasileira.

Cabe notar sobre as palavras de Abreu que no mesmo comunicado, diz ele ter vindo ao Rio Grande do Sul aos 13 anos, e chama o mesmo lugar de “Provincia de S. Pedro de Rio Grande seu Paiz natal”. Isso quer dizer que, se em alguma ocasião declarou algo como “ser de Rio Grande”, não quis dizê-lo ao pé da letra, no sentido de naturalidade, mas sim no sentido de identidade e pertencimento, ou seja, que cresceu em Rio Grande. Aliás, note-se que um dos primeiros nomes de São Carlos de Maldonado, além de Maldonado Chico, foi justamente Povo Novo (Pueblo Nuevo de San Carlos), assim como chamava-se Povo Novo o núcleo adjacente a Rio Grande. Quanto à data, suponho que alguns autores interpretaram 1771 como a data de nascimento de José de Abreu em função desta declaração combinada à data de alistamento no exército (1784), incorrendo, assim, em erro.

Finalmente, se, por um lado, o que declara a família do marechal na ocasião do seu sepultamento, em 1828, reafirma que nasceu em Maldonado, por outro, pode nos fazer imaginar que ele poderia ser de fato mais velho do que imaginava. Eis o assento de sepultamento dos ossos do Barão,[6] no qual diz-se que ele faleceu aos 70 anos em 1827 – e portanto teria nascido, segundo esse documento, por volta de 1757.

Lê-se: “J.e d’Abreu. Aos vinte e hum dias do mez de Fevereiro de mil oitocentos vinte oito annos nesta Matriz de Porto Alegre sepultarão-se os ossos do Barão do Serro Largo Joze d’Abreu, que falleceo no combate entre as nossas Tropas, e as Hespanholas no dia vinte de Fevereiro de anno de mil oitocentos vinte e sette no Passo do Rozario desta Provincia, tendo de idade settenta annos, natural da cidade de Maldonado na Cisplatina, filho legítimo de João de Abreu, e de Dona Anna Maria, cazado com Dona Maria Felicianna da Conceição: foi encomendado por mim. E para constar fiz este assento. – Thomé Luiz de Souza.” Via familysearch.

∼  faço aqui um parêntesis:

∼  Pode parecer estranho

Que uma pessoa não soubesse a própria idade. Mas mesmo hoje ainda há muitos, em localidades mais retiradas, que podem muito bem perder a conta de quantos anos têm. Nos registros eclesiásticos mais antigos, era comum anotar uma idade aproximada. E mesmo em vida, a noção de tempo e o controle rígido dos anos não transparece ter sido de suma importância há séculos atrás. Vejamos, por exemplo, a situação do filho primeiro do Barão do Serro Largo, o Tenente-Coronel Cláudio José de Abreu. Inventariante do Barão e da Baronesa, sua esposa, em 1849, declarou contar 49 anos. A história julgou por muito tempo que houvesse nascido em 1800, afinal – foi isso que ele mesmo declarou. Há alguns anos, porém, tive o prazer de encontrar o seu registro de batismo, ocorrido em 1795. Ele, em meados do oitocentos, errou por cinco anos. Mas o que são cinco anos? É tanta diferença assim, para quem não se importa em controlar quantos anos se passaram?

O tempo é muito relativo.

Seria mesmo tão estranho que alguém, ao final de século XVIII, ou primeiras décadas do século XIX, não soubesse exatamente quantos anos realmente tinha? Não me parece.

∼  fim deste parêntesis

Além das evidências apontadas nessas obras, nos auxilia também a definir o contexto do nascimento do Barão a compreensão das circunstâncias da família Abreu. Realmente, como comenta o general Cidade, a época do nascimento de José de Abreu, Rio Grande e por extensão Povo Novo encontravam-se sob o domínio espanhol. Em 1765, João de Abreu – pai do marechal – está na lista de deportados a São Carlos de Maldonado, atual Uruguai. Mais três autores elucidam o histórico da família Abreu no território espanhol: Brenda Pagola[7] e Carlos Seijo[8].

∼  A família Abreu ∼

Pois bem. O nascimento de José de Abreu, ainda que tenha ocorrido anos depois, remonta à tomada de Rio Grande por Cevallos, em 1763, e alguns poucos anos interiores. O pai de José de Abreu era chamado João de Abreu, de Guimarães, como se lê em todos os registros da família de José de Abreu. Este homem português, João de Abreu, casou-se uma vez, em Rio Grande, em 1757. Vejamos:

jiojoijo

Lê-se: “Aos vinte e hum dias do mes de Outubro do anno de mil setecentos e cincoenta e sete, nesta Matriz de São Pedro do Rio Grande de São Pedro feitas as tres canonicas denunciaçoens na forma do Sagrado Concilio Tridentino e em presença de mim, Vigário da Igreja e da Manuel Francisco da Sylva e das testemunhs abaixo asinadas o Coronel de Dragoens Thomás Luiz Ozorio, e o Capitão mor Francisco Coelho Ozorio se cazarão em face da Igreja solenemente João de Abreu, filho legítimo de Lionel de Abreu e de sua mulher Maria Soares, já defunta, natural da freguesia de Santa Maria do Pinheiro concelho de Vieyra, Arcebispado de Braga, com Anna Bernarda de Jesus, filha legítima de Antonio de Souza, já defunto, e de Antonia Clara da Conceição, baptizada na Vila da Praia da Ilha Terceira, e lhes dei as bençoens. Por verdade fiz este assento. O vigário.” Via familysearch.

Em 1760, nasce o primeiro filho do casal, chamado Vicente:

Lê-se: “Vicente, filho legítimo de João de Abreu natural da freguesia de Santa Maria do Pinheiro concelho de Vieyra Arcebispado de Braga e de sua mulher Anna Bernarda natural da Freguezia da Villa da Praya da ilha Terceira nasceo, aos vinte e dois dias do mez de Janeyro do anno de mil setecentos e secenta, foi baptizado em caza por Antonio Gonçalves de Affonceca e recebeo os Santos Oleos solemnemente por mim Vigario Manoel Francisco da Sylva nesta Matriz de São Pedro do Rio Grande aos trinta e hum dias do dito mez e anno. Neto por parte paterna de Lionel de Abreu e de sua mulher Maria Soares, e por parte materna neta de Antonia Calara e não soube dar mais notícia. Por verdade fiz este assento. O Vigario Manoel Francisco da Silva”. Via familysearch.

Alguns anos se passaram até 1763, o ano da invasão espanhola em Rio Grande. Com o abandono da vila por parte das autoridades, antes que houvesse real confronto de armas, a invasão espanhola ocorreu sem resistência, e de fato, é referida por alguns como “a entrega” de Rio Grande. Sem planejamento, organização ou tempo suficientes para uma retirada da população, esta dispersou-se sem um destino único. Várias famílias atravessaram a Lagoa dos Patos e instalaram-se em São José do Norte e Estreito, muitas transferiram-se para Viamão, Triunfo, Taquari, etc. E muitas, sem nenhuma embarcação com que contar, simplesmente recuaram até Povo Novo – antigamente chamado Torotama.

Neste bizarro armistício, não houve um confronto, mas sim um convite de Pedro de Cevallos – o de fundar um novo núcleo populacional, em território espanhol. Assim, várias famílias decidiram-se por recomeçar a vida em São Carlos de Maldonado, a partir de 1763; e, para João de Abreu, este recomeço iniciou-se em 16 de março de 1765, no dia da partida em uma viagem que, no lombo de muares, e atravessando um rígido inverno, durou até setembro do mesmo ano. Carlos Seijo (Carolinos Ilustres) lista com detalhes os povoadores imigrados em 1763 e 65:

Páginas 234 e 235.[8]

Ali está o nome de João de Abreu, que, assim como João Teixeira e Feliciano José, deixou a esposa à sua espera em Rio Grande por enferma.

Perguntou-se Francisco de Paula Cidade, sobre a mãe do Marechal José de Abreu:

“Resta a dúvida materna: Essa Ana Maria seria a esposa de João de Abreu que não o acompanhou por doente? Teria ele enviuvado e então casado novamente, nascendo-lhe desta união o futuro Barão do Serro Largo e um irmão deste, que figura na documentação da época, porque também foi militar? “

Ana Bernarda juntou-se a João de Abreu em 1766, ano no qual, segundo o trabalho de Brenda Pagola, o casal apadrinha uma criança na população vizinha (São Fernando de Maldonado).[7]

Por volta deste ano deve ter nascido Cláudia Petrona de Abreu, que ao que tudo indica, é a primeira filha do casal em Maldonado, tendo casado-se em 1780 em Rio Grande, portanto, por volta da tenra idade de 14 anos, aproximadamente:

Lê-se: “Aos sinco de Abril de mil sete centos oitenta nesta Matriz do Rio Grande de São Pedro depois de feitas as diligencias necessarias, e não aver impedimento canonico conforme o Sagrado Concilio Tridentino e Constituição e pela Provizão do Reverendo Vigário  da Vara Joze Gomes de Faria pelas oito horas do dia na prezença do Padre Joze Ignacio  de Comissão minha se receberão em matrimonio com palavras de prezente em que expressarão seu mutuo concentimento Joze Martins e Maria Gonçalves de Castilho digo Claudia Petrona de Abreu. O contraente filho legitimo de Thomaz Martins e de Maria Gonçalves natural de São Thiago da cidade de Malaga, e a contranente filha legitima de João de Abreu e de Anna Bernarda natural da freguezia de São Carlos de Maldonado e receberão bençãos, sendo prezentes testemunhas Bento Martins Ferreira, e Manoel Marquez São Payo que vão assinados de que fiz este termo”. Via familysearch.

Com os livros de batismos de São Carlos de Maldonado disponíveis a partir de 1771, assim surge a documentação da prole do casal:

  • “Maria Abreo de Sosa, N. 1771 (L.1B.fl.4), San Carlos.”[7][8] Segundo o familysearch, a data exata de batismo é 20 de maio de 1771;

  • “Joaquín Abreo de Sosa, N 1772 (L.1B.f.16), San Carlos.”[7][8] Segundo o familysearch, nasceu em 23 de março de 1772 e foi batizado aos 29 dias do mesmo mês e ano. “Falleció, según reza la partida de defunción en 1786, “repentinamente ahogado” (L.1D.fl.64), San Carlos, a los 14 años.”[7]

  • “Francisco Manuel Casimiro Abreo de Sosa, N. 1774 (L.1B.fl.41v), San Carlos.”[7][8] Segundo o familysearch, nasceu em 4 de novembro de 1774 e foi batizado no dia seguinte. Diz Carlos Seijo que, segundo Tomas de Razón, Este Francisco de Abreu chegou a alferes, servindo na cavalaria de  Maldonado.[8]

  • “Ramón Abreo de Sosa, N. 1777 (L.1B.fl.66v), San Carlos. Fueran sus padrinos Dn. Miguel Urrutia Capitán y Comandante de la Villa y Da. Vicencia Espíndola.”[7][8] Segundo o familysearch, nasceu em 27 de junho de 1777 e foi batizado no dia seguinte. (Nota: Este é Ramão de Souza Abreu, o irmão de José de Abreu a que se referiu Francisco de Paula Cidade).[2] Aí está ele, no regimento de Entre-Rios, distrito sob o comando de José de Abreu desde 1813[2] (e também aí está um dos filhos do barão, Cândido José de Abreu).

“Idade d’Ouro do Brazil”, 21 de abril de 1818, nº 32, p.5.  Hemeroteca digital brasileira.

Segundo Pagola, João de Abreu roga voltar aos domínios portugueses, sem a família – esta nota não contém data.[7] Possivelmente pretendia assegurar os termos de seu retorno, ou talvez entrar em acordo o casamento de Cláudia Petrona antes de retornar com a família a Rio Grande.

Se paira a dúvida se a família Abreu já havia retornado definitivamente em 1780, certamente em 1782 ela ali já estva em caráter definitivo, como se vê pelo batismo de Manoel, em onze de agosto daquele ano:

Lê-se: “Aos onze dias do mes de agosto de mil sete centos e oitenta e dous nesta Matriz de São Pedro do Rio Grande baptizei e pus os Santos Óleos a Manoel nascido aos dous deste mesmo mez filho de João de Abreu natural de Guimaraens e de Anna Bernarda de Souza natural da ilha Terceira, neto pela parte paterna de Leonel de Abreu e de Maria Soares naturaes de Guimaraens e pela materna de Antonio  de Souza e de Antonia Clara naturaes da ilha Terceira. Forão padrinhos Manoel Peres Campos cazado, e Maria Perpétua cazada do que para constar mandei fazer este assento por mim assignado. O Vig.º Joze Gomes de Faria.” Via familysearch.

 

Infelizmente, apenas 6 anos após o nascimento deste último filho, acha-se o falecimento de Ana Bernarda:

Lê-se: Aos vinte e oito de novembro de mil setecentos e oitenta e oito foi sepultada nesta Matriz de São Pedro do Rio Grande Ana Bernarda de Souza, natural da Ilha Terceira, de mais de quarenta anos de idade, casada com João de Abreu, de quem deixou seis filhos. Recebeu os sacramentos, e foi por mim encomendada. Por verdade fiz este assento.Vigário Pedro Pereira Fernandes de Mesquita.”. Via familysearch.

Seguida de João de Abreu, menos de dois anos depois:

Lê-se: “João de Abreu. Aos vinte e trez dias do mez de Mayo de mil settecentos e noventa foi sepultado no cemiterio do Povo Novo desta freguezia de Sam Pedro do Rio Grande João de Abreu de mais de secenta annos de idade, natural da Provincia de traz dos Montes, viuvo de Anna Bernarda, de quem deixou seis filhos, não recebeo sacramento nem fez testamento, e foi encomendado pelo Padre Manoel dos Santos Rezende. Por verdade Manoel digo mandei fazer este assento que assignei. Vigário Pedro Pereira Fernandes de Mesquita.” Via familysearch.

Assim, Ana Bernarda, da ilha Terceira, a quem o Marechal chamou Ana Maria, de Rio Grande, foi a única esposa de João de Abreu. (Mais detalhes, em um próximo post).

Retomando, os filhos do casal foram:

  • Vicente, 1760, Rio Grande
  • Cláudia Petrona Abreu, ca. 1766, Maldonado
  • José de Abreu, 1770,[3] Maldonado[4]
  • Maria, 1771, Maldonado
  • Joaquim, 1772, Maldonado
  • Francisco Manuel Casemiro, 1774, Maldonado
  • Ramão, 1777, Maldonado
  • Manuel, 1782, Rio Grande

A sucessão de nascimentos a partir de 1771, combinada com o alistamento de José de Abreu no exército em 1784 nos dá a certeza de que José de Abreu nasceu até, no máximo, 1770, como ele mesmo declarou. Neste período a família encontrava-se em caráter definitivo em São Carlos de Maldonado, enquanto Rio Grande achava-se ocupada pelos espanhóis.

 

∼  Quanto a outras fontes

Exceto uma obra, todas as outras que encontrei sobre o Barão do Serro Largo referem-se a 1770 ou, mais comumente 1771, ou alguns anos a mais, ou ainda, mais vagamente, “último tritênio do século XVIII”, o que é uma gama bastante ampla.

Esta uma obra, que aponta uma data anterior a 1770 é a de Mucio Teixeira –Os Gaúchos“, que afirma:

 

“O General José de Abreu, bravo Barão do Serro Largo, nasceu no município de Pelotas a 7 de julho de 1765 e faleceu em campo de batalha a 20 de fevereiro de 1827.”[9] 

O “município de Pelotas” ainda não existia. Povo Novo, sim, descrito por alguns autores como “um lugarejo de Pelotas”.

Aqui faço um adendo, posterior a uma nova informação encontrada, neste artigo de Aurélio Porto – Origens de heróis riograndenses II : Marechal José de Abreu – publicado na Federação, em 1933:

 

O parágrafo específico de interesse sobre os arquivos do Bispado de Pelotas. “vários assentos completamente destruídos pelas traças e pela humidade”. Porto Alegre, A Federação, 17 de abril de 1933. Hemeroteca Digital Brasileira.

 

Aurélio Porto diz ter pesquisado nos arquivos de Pelotas nos atos de batismo entre 1758 e 1759, presumivelmente induzido a calcular esta data de nascimento a partir do auto de sepultamento de Abreu (vide: Os ossos do Barão). Segundo esta apresentação sobre o Instituto Histórico e Geográfico de Pelotas, os registros paroquiais existem a partir de 1812. Mas se Aurélio Porto, que foi um importante historiador do seu tempo, diz que esses documentos existiam, embora em maus estado, até os anos 30, nada impediria que Múcio Teixeira tivesse acesso a esses papéis antes de 1920, ano da publicação de sua obra Os Gaúchos.

Em contato com o IHGP e a Arquidiocese de Pelotas sobre a remota possibilidade de sobrevivência desses documentos – ou se realmente existiram, e neste caso até quando – no momento aguardo resposta.

Se esta data verdadeira fosse, João de Abreu teria deixado a esposa, grávida de mais ou menos cinco meses, para instalar-se em São Carlos. Seria possível que as mulheres descritas como “enfermas” estivessem na verdade procurando poupar-se do extenuante e incerto traslado a Maldonado, que durou até setembro do mesmo ano? Poderia o Barão do Serro Largo, ter sido a vida toda 5 anos mais velho do que ele mesmo supunha – como parece ter feito, aliás, o primeiro filho, Cláudio José de Abreu, em meados do século XIX, quando foi inventariante do Barão e esposa?

É curioso. E não poderia ser mais poético, se o Marechal que tanto lutou contra Artigas e pela anexação da Província Cisplatina tivesse nascido justamente em meio a um estranho processo de transplante populacional, em circunstâncias excepcionais, que chegou a dividir e reunir a família em que nasceu, nos extremos de dois mundos em conflito. Porém – e este é um grande e decisivo porém – o autor Mucio Teixeira não indica nenhuma fonte com a qual poderia embasar esta preciosa informação. Pessoalmente, até agora não encontrei nenhum registro de batismo da família de João de Abreu neste período, em nenhuma localidade próxima a Rio Grande (em particular, Estreito), e tampouco em algum outro lugar do Rio Grande do Sul. Resta, por fim, advertir que outros erros aleatórios foram já encontrados em dados biográficos de outros vultos históricos nesta mesma obra, deste mesmo autor.

Com minúcia desta, que vos escreve

 

helga

~Helga. 

Em destaque: sapatinhos de bebê, fim da década 60 do século XVIII. “Rare 18th Century Shoes English Leather 1760’s”. Via RubyLane.com



Fontes
[1] PARANHOS Jr., José Maria da Silva. Esboço biográfico do general José de Abreu, Barão do Serro Largo. Revista trimestral do IHGB, tomo XXXI, parte II, p. 62-135. Rio de Janeiro: B. L. Garnier, 1868.
[2.1] [2.2] [2.3] [2.4] CIDADE, Francisco de Paula. Dois Ensaios de História. Rio  de Janeiro: Bibliex, 1966.
[3.1] [3.2] ”Do L. “Matrícula do Novo Corpo desta fronteira, (Rio Grande)” segunda Companhia, capitão João Marcos de Madureira, a f. 85 v°” in: PARANHOS Jr., José Maria da Silva. Esboço biográfico do general José de Abreu, Barão do Serro Largo. Revista trimestral do IHGB, tomo XXXI, parte II, p. 62-135. Rio de Janeiro: B. L. Garnier, 1868.
[4.1] [4.2] Registro de casamento com Maria Feliciana de Souza, 20 de maio de 1794.
[5] Hemeroteca Digital Brasileira. Periódico “O Universal“, Minas Gerais, 1826, Nº 117, 14 de abril de 1826, p. 2.
[6] Registro de sepultamento de José de Abreu, 21 de fevereiro de 1828.
[7.1] [7.2] [7.3] [7.4] [7.5] [7.6] [7.7] [7.8] PAGOLA, Brenda.«…Y ellos le dieran vida» : San Carlos: fundadores y vecinos. Montevidéu: Arca, 1998.
[8.1] [8.2] [8.3] [8.4] [8.5] [8.6] [8.7] SEIJO, Carlos. Carolinos : Ilustres, Patriotas y Benemeritos. Montevidéu: El Siglo Ilustrado, s/a.
[9] TEIXEIRA, Mucio Scevola Lopes. Os Gaúchos : Estudo do meio physico, do momento histórico, da vida pampeana, do cancioneiro popular e synthese biográphica dos rio-grandenses illustres. Rio de Janeiro: Leite Ribeiro & Maurilio, 1920.

José de Abreu (iv) : O retrato pictórico

[misterioso]

Salve!

Circula pela internet, com pouquíssimos pixels e incontáveis reproduções, uma imagem que retrata o famoso José de Abreu:

A reprodução do retrato de José de Abreu, como encontra-se na rede mundial de telecomputadores. Realmente faltou a ferramenta “enhance” (vide a cena de Blade Runner – lembrando que faltam apenas dois anos para 2019 :-).

 

O retrato, tradicionalmente atribuído a José de Abreu. Esta versão me foi enviada pela Comunicação Social do 6º RCB de Alegrete, sendo existente neste regimento, chamado “Regimento José de Abreu”. Note-se que a imagem parece ter sido cortada na extremidade inferior. Ao que parece até o momento, esta é uma reprodução de um original, sobre o qual ainda procuro desvendar mais.

 

Ao que parece, foi baseado na imagem acima que, em 1937, João Faria Viana representou o Barão do Serro Largo na reconhecida obra de Mário Teixeira de Carvalho, o Nobiliário Sul-Riograndense, como vemos:

No Museu Júlio de Castilhos encontra-se ainda outro retrato – sobre este comentou Francisco de Paula Cidade, em Dois ensaios de História. A imagem tem semelhanças e diferenças em comparação às imagens anteriores.

Sobre o primeiro retrato, todas as informações ainda estou por descobrir (exceto que não encontra-se no Museu Julio  de Castilhos). Mas a imagem em questão, mesmo vista pela tela do computador e em baixa resolução, oferece várias pistas no figurino e na numismática que vestem o sujeito retratado. Este último campo de estudos ocupa-se de moedas e símbolos, e duas ciências de que derivam dela serão aqui de particular interesse: a falerística e a medalhística. (Nota: atualização em 15 de junho de 1017: uma versão com mais qualidade já está incluída neste post e no Repositório. A imagem foi gentilmente enviada pela Comunicação Social do Regimento José de abreu, na voz do Sargento Hiliunes).

– A medalhística…

Estuda medalhas, é claro. Neste caso duas delas aparecem no retrato:

“Perdoai a pouca resolução”

Estas estão claramente representadas no busto de José de Abreu que existe no 6º Batalhão de Cavalaria de Alegrete, como já postado previamente aqui:

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Êi-la novamente: “Busto do Barão no 6º Regimento de Cavalaria de Alegrete. Foto: Juner Vieira/ especial / cp, reproduzida da mesma notícia.” Nota: A Comunicação Social do 6º Regimento de Cavalaria Blindada, o “Regimento José de Abreu”, de Alegrete, na voz do gentilíssimo Sargento Hiliunes, teve a bondade de informar que este busto foi inaugurado em 21 de outubro de 1957, e produzido pela antiga metalúrgica Eberle.

 

 

– Em detalhe, as medalhas – Segundo o mesmo Sargento Hiliunes, não é possível, pessoalmente, identificar que medalhas são estas. Certo é que estão feitas à semelhança do retrato acima, existente no mesmo Regimento.

Supunha que o Regimento do qual José de Abreu é patrono soubesse exatamente que medalhas são estas. Mas em contato com o Regimento José de Abreu, esta ainda é uma questão em aberto. Ofereço aqui uma alternativa:

Tendo em mente que os momentos mais notáveis de José de Abreu deram-se entre os anos de 1811 e 1820, a identificação destas medalhas – mesmo sem poder ver bem – torna-se um pouco mais embasada, ainda que seja, para mim, um jogo de adivinhação.

A medalha da direita é, aparentemente, esta:

COSTA, Sérgio Paulo Muniz. “A construção da fronteira sul”, p.284. Reproduzido da obra de Jonas de Morais Correia Filho, “Símbolos Nacionais na Independência” (Rio de Janeiro, 1994).

Sabe-se que a medalha está em verde e amarelo, e uma descrição perfeitamente detalhada encontra-se aqui – “As Medalhas e Ordens Militares e Civis do Brasil:

MEDALHA DE CAMPANHA CISPLATINA – 1816-1821

Destinada a distinguir os componentes do Exército e esquadra sob o comando em chefe do Ten. Gal. Visconde de Laguna. Foi criada pelo Decreto de 31-I-1823.

Característica. A medalha tinha a forma de cruz, de ouro para os oficiais generais, de prata para os demais oficiais e de estanho ou metal branco para os praças de pré.

No anverso, o centro era de esmalte azul, e nele se achava gravado um ramo de oliveira posto sobre o Serro de Montevidéu, circundado por uma coroa circular, onde havia a inscrição MONTEVIDEO, em cima, e, um ramo de louro em baixo.

No reverso, o centro era de esmalte verde com a legenda PETRUS PRIMUS, BRASILIAE IMPERATOR, DEDIT, circundado por um ramo de louro.

A cruz era encimada por um dragão alado que representa a Casa de Bragança. O número de anos de campanha era marcado nos braços da cruz, da seguinte forma: um, era inscrito no braço superior da cruz; dois, era inscrito nos braços laterais; três, no superior e no braços laterais; quatro, nos quatro braços; cinco, nos quatro lados do anverso e no superior do reverso e seis anos nos quatro lados do anverso e nos laterais do reverso.

A medalha era usada do lado esquerdo do peito, pendente de fita verde, orlada de amarelo, com passador em metal correspondente ao da cruz, com a legenda MDCCCXXII.”

E já que estamos aqui…

A Cruz da Cisplatina, colorizada por esta, que vos escreve. Tentei, decerto em vão, não errar.

Da medalha da esquerda ainda não encontrei nenhuma imagem que pudesse corresponder. Minha melhor ideia é que seja a medalha assim descrita em Academia de História Militar Terrestre do Brasil:

“(Omitida a gravura)

Medalha das Campanhas de 1816 e 1820 contra Artigas. Foi criada por decreto [sic] de 15 de setembro de 1822, por D. Pedro I, para premiar os militares que tomaram parte das tropas ao comando do Marques de Alegrete e depois do Conde da Figueira que venceram Artigas respectivamente em Catalan em 1816, e em Taquarembó, em 1820. A medalha consiste numa Cruz de Malta maçanetada, tendo ao centro a medalha conferida ao Exército Pacificador da Banda Oriental.

Ela figura em preto e branco em O Exército e a medalhística, p.56″

Primeiro vale dizer que as batalhas condizem com o histórico do Barão do Sêrro Largo, que àquelas alturas ainda não era um oficial general, mas sim tenente-coronel, durante a batalha do Catalão, e brigadeiro, na batalha de Taquarembó (na qual o seu desempenho, aliás, valeu-lhe a promoção a marechal-de-campo graduado, em 1º de março de 1820).

Interpretando a descrição, “Cruz de Malta maçanetada, tendo ao centro a medalha conferida ao Exército Pacificador da Banda Oriental”, onde a Cruz de Malta é a  forma reproduzida abaixo, e “maçanetada” significa neste contexto”ao redor”, falta apenas imaginar inserida nela a medalha dada aos pacificadores da Banda Oriental.

Cruz de Malta, Wikimedia Commons

Mais uma vez encontrei somente a descrição, na mesma fonte anterior:

“(Omitida a gravura)

Medalha de Campanha do Exército Pacificador da Banda Oriental – 1812:

Foi criado como escudo de distinção do Exército Pacificador da Banda Oriental, por decreto [sic] de 20 de janeiro de 1815, do Príncipe Regente D. João. Era para ser usada no braço direito. As dos oficiais generais eram de ouro. As dos demais oficiais, cadetes e empregados civis eram de prata. As das praças eram de estanho. Decreto [sic] de 25 de setembro de 1822 substituiu os escudos, por medalhas e permitiu que elas fossem usadas pendentes do pescoço por uma fita amarela pelos oficiais generais. Para os demais ela era presa na farda no lado esquerdo, com uma fita amarela. Os feridos em combate recebiam a medalha perfurada, simbolizando uma cicatriz de combate. (Omitida). Ela consta em preto e branco da obra O Exército e a medalhística p. 26).”

Não há, no meu entender, nenhuma discrepância entre as descrições acima e a medalha cor de prata, emoldurada por uma cruz de malta e suspensa por fita amarela do lado esquerdo da farda, como retratado na primeira imagem deste humilde post.

Mas vamos ver ainda as demais insígnias na imagem. Para isso, vamos recorrer à

falerística.

E poderemos facilmente identificar as duas condecorações restantes no retrato, mesmo que uma delas encontre-se parcialmente excluída da reprodução.

Segundo Aurélio Porto, em seu Dicionário enciclopédico do Rio Grande do Sul, José de Abreu

“Recebeu mais a placa e cruz da ordem de São Bento de Aviz, a de cavaleiro da Ordem Imperial do Cruzeiro, e a efetivação no Comando das Armas da Província, e a de marechal-de-campo em 12 de outubro de 1824.”

A insígnia de São Bento de Aviz está presente, como se afere nesta imagem, extraída da compilação de Artidório Augusto Xavier Pinheiro:

“A placa e a cruz” estão associadas ao grau de Comendador, o terceiro de 5 graus desta ordem. “Insígnia: cruz latina verde, flordelizada.” A cruz com fita é sem dúvida a condecoração usada no pescoço do retratado – vide:

Um zoom do objeto em questão no retrato de que tratamos aqui – para os que tem preguiça de rolar até lá em cima.

A insígnia de Cavaleiro da a Imperial Ordem do Cruzeiro, criada em 1º de dezembro de 1822 por Dom Pedro I, seria usada por José de Abreu – Cavaleiro era o menor dos 4 graus. Este poderia muito bem ser o adereço que se encontra logo abaixo das medalhas.

Com muito boa vontade, vemos o topo de uma ponta bifurcada, pendente de uma coroa.

Enfim, até agora, nas medalhas e condecorações, não há nenhuma contradição entre o retrato e a trajetória do Barão do Serro Largo. Falta apenas verificar agora a farda: e no processo de escrever este post descobri que há, inclusive, um ramo do conhecimento denominado

uniformologia.

Sem entrar em complexas terminologias e definições, precisamos primeiro determinar a época do retrato.

Como vimos, entre as medalhas e insígnias que estão na pintura, a mais recente será a primeira a ser tratada neste post, criada em 1º de dezembro de 1823. Nesta data o Barão do Serro Largo era já marechal-de-campo, graduado em 1820 e efetivado em 1824. Este foi o seu mais alto posto. A fim de confirmar a adequação histórica do uniforme no retrato, é ferramenta essencial a obra de Gustavo Barroso – Uniformes do Exército Brasileiro, 1730-1922.

À página 89 deste volume, está o número da figura que procuro. São de particular interesse os figurinos B e E.

Êi-los:

De todos esses uniformes, o que melhor se associa ao que se encontra no retrato é o penúltimo da esquerda para a direita, ou seja, a estampa E. Corresponde ao pequeno uniforme de um marechal-de-campo, em 1823. Aquarela de José Wasth Rodrigues, 1922.

Enhance! O “pequeno uniforme” parece equivaler ao que atualmente se chama uniforme de serviço, segundo Lagos Militar.

Nota-se, por pouco, a ponta de uma franja na dragona do ombro esquerdo. A frente é com botões dourados e sem bordados, que ficam restritos à gola.

Até aqui, sem surpresas, nada fora do esperado. Este retrato, original ou póstumo, está feito para refletir as condecorações do Barão.

Agora, sobre o retrato do Museu Julio de Castilhos – em primeiro lugar, aqui está:

 

Retrato de José de Abreu. Reprodução gentilmente cedida pelo Museu Julio de Castilhos, Porto Alegre. Autor desconhecido, assinatura não reconhecida. Crayon sobre papel, 50x39cm. Item do acervo Nº 143, recebido como doação do Quartel General do III Exército, em 1949.

Retrato de José de Abreu. Reprodução gentilmente cedida pelo Museu Julio de Castilhos, Porto Alegre. Autor desconhecido, assinatura não reconhecida. Crayon sobre papel, 50x39cm. Item do acervo Nº 143, recebido como doação do Quartel General do III Exército, em 1949. A insígnia é a da Ordem do Cruzeiro, mas o uniforme não parece o de um oficial general daquele tempo.

Em segundo, cabe dizer que as dúvidas levantadas sobre a correta atribuição na obra de Cidade (Dois ensaios de história) são de cunho muito subjetivo, tratando-se especificamente da sua aparência:

“Além disso, a fisionomia não parece ser a de um caboclo, cruza de branco com índio, conforme a mestiçagem que lhe atribuem vários dos que com ele privaram, um dos quais o aponta como sendo um dos maiores conhecedores da língua indígena.”

Infelizmente, neste aspecto, foi o autor de Dois Ensaios de História induzido ao erro pelo próprio Barão do Serro Largo, pelas suas declarações às vezes dúbias, os às vezes contraditórias, ao menos na superficialidade das aparências, sobre si mesmo. Mas a afirmação de que Abreu era de origem indígena, como ainda cabe esmiuçar em outro momento, simplesmente não procede de nenhuma fonte primária.

Por fim, sobre o retrato em questão, diz Cidade:

“Há dúvidas sobre sua autenticidade, havendo mesmo quem diga que deve ser um dos membros da família do Barão.”

Sobre a possível atribuição deste retrato a um dos familiares do Marechal, nenhum dos seus quatro filhos (eram eles: Cláudio José de Abreu; José Inácio de Abreu; Manoel José de Abreu; Cândido José de Abreu), nem seu irmão (Romão de Souza e Abreu) atingiram o mesmo reconhecimento, ou sequer reconhecimento comparável, ao deste grande vulto da história da formação da fronteira Sul do Brasil. Certamente teriam menos medalhas e condecorações, e não chegariam a usar uma farda de oficial general, como a do pai. Além disso, como declarou o próprio Cidade, os filhos de José de Abreu pretendiam afiliar-se à Ordem de Cristo, cujas insígnias eram estas:

 

Já a minha hesitação sobre a atribuição correta do retrato do Museu Julio de Castilhos tem a ver justamente com os tópicos aqui tratados: a condecoração e o uniforme. E, em se tratando de concluir qual desses retratos seria o predecessor dos demais, falta ainda descobrir mais sobre o primeiro aqui mostrado.

 

Sem mais até o momento, despeço-me aqui.

Esta, que vos escreve

helga

~Helga.

Em destaque: reprodução parcial do retrato do Barão por João Faria Viana, colorizado por esta, que vos escreve. A figura inteira está publicada neste post, em Colírio.

Principais fontes bibliográficas:

BARROSO, Gustavo. Uniformes do Exército Brasileiro, 1730-1922. Paris: Ferroud, 1922.

CARVALHO, Mário Teixeira de. Nobiliário Sul-Riograndense. Porto Alegre: Renascença: Edigal, 2011.

COSTA, Sérgio Paulo Muniz. A construção da fronteira sul. Porto Alegre: IHGRGS, 2015.

CIDADE, Francisco de Paula. Dois Ensaios de História. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1966.

PINHEIRO, Artidório Augusto Xavier. Organisação das Ordens Honoríficas do Império do Brazil. São Paulo: Jorge Seckler & C., 1884.

PORTO, Aurélio. Dicionário enciclopédico do Rio Grande do Sul, 1º Vol. Porto Alegre: Universo, 1936.

VASCONCELOS, Rodolfo Smith de & Vasconcelos, Jaime Smith de. Arquivo Nobiliárquico Brasileiro. Lausana: La Concorde, 1918.